A gente bem que tenta se redimir de nossos próprios
pensamentos, afastando idéias que parecem sempre tão incômodas e até
criminosas. O politicamente correto está aí, caçando e enjaulando nossas idéias.
Ineficazmente a gente tenta não pensar, sublimar as sinapses até que nossa
sujeira mental se eterifique, tornando-nos Budas Modernos. Pois é... Eu tentei
não pensar, mas estava sentado observando Fabrício de pernas cruzadas na sala.
Ele estava de braços cruzados com a blusa de seu time de coração, o Flamengo,
com o cenho fechado, assistindo uma
partida do Brasileirão. Para ele, uma coisa tão corriqueira quanto beber água.
Para mim, gay e desatento do mundo esportivo, um hábito quase sem sentido.
Me joguei no pufe ao lado do sofá e fiquei ali, olhando pras
pernas dele. Não lembrava que ele tivesse tantos pelos. E menos ainda me
recordava que aqueles fios pretos fossem simbioticamente tão bonitos com sua
pele morena de sol. Ele era um à toa e, embora conversássemos tanto e
pudéssemos ser amigos, eu sempre guardei muitas reservas a respeito de seu
estilo de vida. Ele não chegaria a lugar algum - eu conclui. E, do alto de
minha arrogância, eu achava que, ao contrário dele, eu tinha um encontro
marcado com o sucesso pelo simples fato de me lançar sobre meus livros como uma
traça esfomeada. As traças, no entanto, eu deveria me lembrar, continuam
traças. Repugnantes e secas.
Fabrício
era bonito. E eu, naquele instante, o desejei. Do jeito mais idiota e
adolescente possível.Sabe aquele tesão esquisito e repentino? Daquele que te
entorpece os sentidos e que, se levado ao ato sexual, te deixa quase sem ar?
Era isso! Sacudi a cabeça quase que querendo me livrar daquelas malignas
imagens que se criaram dentro da minha cabeça. Ora, eu tinha um namorado de 5
anos! Alguém sério e sóbrio do meu lado. Eu o amava, até porque sentia ciúmes
dele. Isto devia ser sinal de amor. Quem fica tanto tempo com alguém e ainda
sente ciúmes e não ama? Mas... porque mesmo eu não sentia esta atração cáustica
pelo Carlos? Me levantei e fui pro quarto, sofrendo de auto martírio.
Como eu
podia me sentir atraído por um estranho, sem importância ou significado
profundo como o Fabrício?
Já o Carlos não. Tínhamos uma história, um
afeto regado a prantos e alegrias. Foram aniversários, natais, dias dos
namorados, chamego e trocas de promessas. Tudo isso tem um valor muito grande
porque tende a se perpetuar. Somos tolos
visuais, isto sem dúvida. E somos sexualizados. Quanto mais penso no amor, mais
me dou conta de que o ser humano apenas tangencia o seu conceito. Não temos
muita certeza do que seja isso. Se sentíssemos ele nas entranhas, talvez o
sentido físico do sexo se perdesse. Estaríamos plenos e satisfeitos. Mas somos
eternos desajustados...
Liguei o
computador e mandei um e-mail pro Carlos.
"Eu
te amo" - disse. Resumindo em uma linha um oceano de incompreensões. Quem não entende, acaba fadado a reproduzir.
por Bernardo
por Bernardo
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